CESINA BERMUDES

1 – Nome conhecido / Nome civil

Cesina Bermudes / Cesina Borges Adães Bermudes

 

2 – Local, data de nascimento / Local, data de morte

Lisboa (Anjos), 20 de maio de 1908 / Lisboa, 9 de dezembro de 2001

 

3 – Profissão / cargo / função / ocupação

Médica, docente, ativista feminista

 

4 – Relação com organizações feministas

Comissão Eleitoral Feminina da secção de Lisboa (uma das dirigentes): apoio à candidatura presidencial do general Norton de Matos (1949)

Comissão Central do Movimento Nacional Democrático Feminino

Comité Nacional de Defesa da Paz (dentro do MND)

 

5 – Eventos feministas em que participou / foi nomeada para participar

 

6 – Publicações de teor feminista (autoria, entrevistas)

 

7 – Sociabilidades, correspondência com outras feministas

Maria Isabel Aboim Inglez

Maria da Graça Amado da Cunha

Maria Keil

Manuela Porto

Maria Palmira Tito de Morais

Maria Valentina Trigo de Sousa

Elina Guimarães

Maria Lamas

Virgínia Moura

Ermelinda Cortesão

Luísa de Almeida

Maria Lígia Valente da Fonseca Severino

Natália Correia

 

8 – Manifestações de reconhecimento público (incluindo toponímia), prémios, condecorações

Figura na toponímia de Lisboa (freguesia de Carnide); a 19 de maio de 1989 recebeu a Medalha de Comendador da Ordem da Liberdade

 

9 – Espólios

 

10 – Elementos biográficos do percurso de vida, incluindo moradas: sumário

A médica Cesina Bermudes (1908-2001), a primeira mulher doutorada em medicina, foi precursora na introdução das técnicas do parto psico-profilático (parto sem dor), em Portugal, e destacou-se na oposição ao Estado Novo, tendo sido presa. Foi ainda uma atleta de exceção, campeã de natação, praticante de hipismo e participante em corridas de automóveis e bicicletas – em 12 de outubro de 1924 ganhou a primeira edição da Volta a Lisboa em bicicleta na categoria Senhoras[1]–. Filha de Félix Redondo Adães Bermudes, escritor e dramaturgo, e de Cândida Bermudes, é oriunda de uma família da burguesia lisboeta. Fez a instrução primária em casa e estudou no Liceu Camões. Desde 1927, influenciada pelo pai, pertenceu à Sociedade Teosófica (aqui desempenhou as funções de secretária-geral), acreditava na reencarnação e adotou a alimentação vegetariana. O seu desejo de ser médica manifestou-se aos 11 anos, por influência familiar. O tio materno Lacerda de Melo (que inspirou a personagem João Semana de As Pupilas do Senhor Reitor, de Júlio Diniz), contou-lhe sobre a sua vida de médico de aldeia e sobre o seu trabalho junto de pessoas pobres a quem não cobrava as consultas[2]. Quando acabou o 7.º ano, em 1926, ingressou na Faculdade de Medicina de Lisboa. Concluído o curso, em 1933[3] (com 24 anos), fez o internato geral e de cirurgia e depois a especialidade em obstetrícia, na maternidade Alfredo da Costa. Posicionando-se politicamente contra o regime de Salazar, em 1945, subscreveu a constituição de uma Comissão de Mulheres, criada no seio do MUD – Movimento Unitário Democrático, cujo programa se apresentava no manifesto “As mulheres e o movimento de oposição”. Em 1947, conclui o doutoramento em medicina (com 19 valores) tendo sido a primeira mulher a fazê-lo. A sua atividade política impediu-a de tomar posse como Professora efetiva, como seria previsível “o que a verificar-se a teria colocado na situação de primeira mulher Professora da Faculdade de Medicina” (Santos, 2005, p. 219). A atividade docente foi realizada com a disciplina de Puericultura em várias escolas industriais. Foi membro da Sociedade Anatómica de Portugal e da Sociedade Anatómica Luso-Espano-Americana. Em 1948-1949 envolveu-se na campanha presidencial do general Norton de Matos, sendo uma das dirigentes da Comissão Eleitoral Feminina da secção de Lisboa, tendo discursado em várias ocasiões. A campanha realizada pelas mulheres apresenta “uma agenda reivindicativa feminista” (Janeiro, 2010, p. 9) que é sintetizada no “Discurso pronunciado pela Dra. Cesina Bermudes, em Santarém” (Às mulheres de Portugal…, 1949, p. 98-99). Inclui a abolição do regulamento da prostituição; salário igual para trabalho igual; equiparação jurídica dos dois sexos; assistência social para as mulheres independentemente do estado civil; sufrágio universal. Num discurso proferido em Évora faz um diagnóstico “das carências das mulheres portuguesas pobres, nos campos da assistência médica em geral e da assistência às grávidas, às parturientes e às mães com filhos recém-nascidos, concluindo pela falência da política do Estado Novo” (Janeiro, 2010, p. 16), que acusa de confundir caridade com assistência. Por outro lado, define as mulheres que apoiam o regime e atacam a sua proposta de alargamento da saúde materna a todas as mães, sem exclusão das solteiras, como “moralistas sem coração e sem miolos” (Bermudes, 1949, p. 83).

Entre 14 de outubro de 1949 e 14 de janeiro de 1950 esteve presa no Forte de Caxias (Processo 19.4.48)[4] por integrar a organização formada na sequência dos trabalhos de apoio à candidatura do general, a Comissão Central do Movimento Nacional Democrático Feminino. Em 1950, envolve-se na constituição do Comité Nacional de Defesa da Paz, juntamente com Maria Isabel Aboim Inglez, Maria Lamas e Virgínia Moura. Em 1954, fez um curso em Paris sobre as técnicas do parto sem dor, tendo trabalhado com o Dr. Lamaze, um seguidor dessa prática criada nos anos 1920 na URSS. Cesina Bermudes vai ser a precursora dessa técnica em Portugal. A sua prática obstétrica contribuiu para desmistificar a dor e o parto e para reduzir o medo e ansiedade sobre o nascimento das crianças culturalmente fundados. “Assinou, com Virgínia Moura, o documento comemorativo do 10.º aniversário do MUD (1955) e, em 1957, integrou com as escritoras Maria Lígia Valente da Fonseca Severino e Natália Correia, a Comissão Cívica Eleitoral de Lisboa, para que a oposição pudesse intervir legalmente nas eleições que se avizinhavam (…)” (Esteves, 2013, p. 179). Após o apoio às candidaturas de Arlindo Vicente e do general Humberto Delgado a sua visibilidade política foi atenuada. Deu, no entanto, continuidade à sua ação solidária na assistência médica, tendo ajudado parturientes do Partido Comunista Português, que viviam na ilegalidade. O seu percurso pessoal, profissional e político foi muito apoiado pelo seu pai, por quem tinha grande admiração, considerando-o um feminista, um defensor dos direitos das mulheres, que lutou contra a discriminação e invisibilidade a que estavam votadas. Após o 25 de Abril, o seu mérito, tenacidade e postura humanista foram reconhecidos publicamente, tendo recebido a Medalha da Ordem da Liberdade (19, maio, 1989).

“Quando um parto era difícil e longo, ela não deixava o lado da mulher; às vezes, dormia no chão ao lado dela ou em uma cama improvisada. Quando nos medicava, `emprestava-nos` alguns comprimidos para que pudéssemos começar imediatamente. Qualquer coisa que sobrasse era-lhe devolvida para que ela pudesse repassá-la às mais pobres de nós.”

(testemunho anónimo em: https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/)

11 – Fontes bibliográficas primárias

BERMUDES, Cesina (1949) – Discurso pronunciado pela Sra Doutora Cesina Bermudes, em Évora, In Às Mulheres de Portugal. Colectânea dalguns discursos pronunciados para propaganda da Candidatura. (Prefácio do Prof. Azevedo Gomes). Lisboa: edição dos Serviços Centrais da Candidatura do General Norton de Matos.

“Inquérito entre as mulheres portuguesas ao parto sem dor”, entrevista a Dulce Rebelo, Jornal-Magazine da Mulher, n.º 48, marco, 1955.

“Cesina Bermudes, 91 anos a ouvir os primeiros vagidos”, entrevista a António Melo, Público, 6 de junho, 1999.

 

  12 – Fontes bibliográficas secundárias

 ABREU, Ilda Soares; SANTOS, Maria Teresa (2001) – Cesina Bermudes, um caso de interesse prático pela condição feminina. «Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher», n.º 5, p.195-200.

ESTEVES, João (2013) – Cesina Borges Adães Bermudes. In CASTRO, Zília Osório; ESTEVES, João, dir.Feminæ Dicionário Contemporâneo. Lisboa: Livros Horizonte, p. 179-180.

GORJÃO, Vanda (2002) – Mulheres em Tempos Sombrios. Oposição Feminina ao Estado Novo. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais. Coleção Estudos e Investigação.

JANEIRO, Helena Pinto (2010) – A questão feminina na campanha de Norton de Matos. In PAULO, Heloísa; JANEIRO, Helena Pinto, ed. – Norton de Matos e as Eleições Presidenciais de 1949: 60 anos depois. Lisboa: Colibri, p. 35-56.

NATÁRIO, Anabela (2008) – Cesina Bermudes, Portuguesas com História – Século XX. Lisboa: Temas e Debates, p. 98-107.

SANTOS, Maria Teresa (2005) – Cesina Borges Adães Bermudes. In CASTRO, Zília Osório; ESTEVES, João, dir. – Dicionário no Feminino. Séculos XIX e XX. Lisboa: Livros Horizonte, p. 218.

 

13 – Fontes Iconográficas e Audiovisuais;

– Carta assinada de Cesina Bermudes em MDM: https://www.mdm.org.pt/cesina-bermudes/

– Registo Criminal: https://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/2018/05/sou-o-benfiquista-mais-rico-do-mundo.html

– Foto de juventude com o pai e a irmã a cavalo:  https://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/2018/05/sou-o-benfiquista-mais-rico-do-mundo.html:

– Foto de juventude com a irmã em bicicleta:  https://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/2018/05/sou-o-benfiquista-mais-rico-do-mundo.html:

– Foto de juventude com a irmã em patins:  https://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/2018/05/sou-o-benfiquista-mais-rico-do-mundo.html:

– Foto de jornal com notícia sobre parto sem dor (25/04/1956) : https://www.jornaltornado.pt/cesina-bermudes/

– Foto de comício de Lisboa (Voz do Operário), candidatura de Norton de Matos, 1949, Cesina Bermudes, Maria Lamas, Manuel da Palma Carlos: http://www.casacomum.org/cc/visualizador?pasta=04654.000.026

– Foto de comício, candidatura de Norton de Matos, 1949,

http://manuel-bernardinomachado.blogspot.com/2017/11/cesina-bermudes-no-dia-do-seu.html

– Carta enviada ao Governador Civil de Lisboa, assinada, entre outras, por Cesina Bermudes “As Mulheres Democratas protestam contra o Tarrafal” (31/03/1947): http://manuel-bernardinomachado.blogspot.com/2017/11/cesina-bermudes-no-dia-do-seu.html

– Fotos várias em: https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/

 

13a) – Foto de Perfil

Com o vestido usado na sua prova de doutoramento (1947) : https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/

NOTAS:

[1] https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/

[2] https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/

[3] As datas de conclusão do curso diferem. Em Maria Teresa Santos (2005) : 1932 ; Em João Esteves (2013) : 1933.

[4] https://shethoughtit.ilcml.com/biography/cesina-bermudes/

Inventariante / data:

Ana Ribeiro (anaribeirodasilva.mail@gmail.com) / novembro 2021

Este trabalho, para efeitos de citação:

RIBEIRO, Ana (2021) –  Cesina Bermudes. In BRASIL, Elisabete; LAGARTO, Mariana; RIBEIRO, Ana (2021) – Feminismos antes do 25 de Abril de 1974 (Portugal 1890-1949). Lisboa: FEM, p. 142-147.

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